
Vivemos em uma era em que se fala muito em “hiperinformação”, mas talvez o termo mais justo fosse hiperruído. Não se trata de excesso de conteúdo útil ou conhecimento real, e sim de uma profusão de sons, palavras, imagens e estímulos que se anulam, se repetem, se atropelam — informações sem substância, desprovidas de profundidade e contexto, que se apresentam como relevantes, mas apenas saturam.
Diferente de uma época em que o acesso ao saber exigia esforço, instrução e filtros naturais — como escassez de meios, rigor editorial ou barreiras materiais — hoje temos à disposição um volume colossal de conteúdo. Em termos objetivos, nunca foi tão fácil acessar obras-primas da literatura, da música erudita, do pensamento filosófico. E, no entanto, essa facilidade não se converte automaticamente em formação.
A razão está no ruído. Há tanto sendo dito, tanto sendo publicado, que o próprio sentido de valor se dilui. O que é relevante se mistura com o que é fútil. Notícias reais e eventos fabricados circulam com a mesma velocidade. Opiniões mal pensadas, descontextualizadas ou repetitivas passam a parecer conhecimento. A repetição anestesia.
Essa realidade se agrava com o que podemos chamar de hiperestímulo — uma condição sensorial própria da era digital, intensificada pela presença constante dos smartphones e das redes sociais. Não mais apenas texto, mas também imagens e vídeos que invadem os sentidos com velocidade e facilidade inéditas. A imagem, por sua natureza, é mais rapidamente absorvida que o texto, o que a torna também mais perigosa: o impacto emocional antecede o pensamento crítico. E nesse processo, a mente se curva ao instante.
O hiperestímulo não apenas confunde. Ele molda o próprio desejo. Porque tudo é apresentado com brilho, cor, movimento e urgência, não há tempo para distinguir o que vem de dentro e o que foi induzido. O fluxo é constante, global, ininterrupto. E acabamos desejando o que nos foi oferecido demasiadas vezes, não por escolha, mas por exaustão.
Como distinguir o que é nosso, então? Até onde aquilo que julgamos querer é, de fato, uma vontade genuína — ou apenas uma reverberação do que nos foi imposto, repetido, estimulado? A luz do hiperestímulo não revela, como uma iluminação interior. Ela ofusca.
Vivemos como alguém exposto a uma luz intensa demais: os sentidos não aguçam, mas embotam. O tato com o real se perde. E essa condição não fica apenas no mundo virtual. Ela transborda para a vida concreta, para nossas decisões, para nossos vínculos, para a forma como interpretamos o mundo ao nosso redor.
Essa reflexão não busca apontar soluções imediatas. Mas sim, observar com atenção onde estamos, como somos afetados, e até onde somos cúmplices disso tudo — como consumidores, como emissores, como seres sensíveis. É preciso reconhecer que a moldura do mundo hoje interfere na paisagem que vemos.